Resenha do Texto: Tobias dos Santos Gomes
A autora começa o texto falando da novidade que é o reconhecimento de direitos de proteção de interesses das comunidades tradicionais, sendo inserido nos direitos das minorias. Propõe-se a tratar a questão da proteção dos conhecimentos tradicionais.
O conhecimento tradicional da biodiversidade deve ser visualizado a partir dos diversos vieses, como conservação da diversidade biológica, agricultura, bens imateriais e autodeterminação dos povos na gestão de seu patrimônio.
Existem diversos cenários de disputa sobre os conhecimentos tradicionais (Trips, OMC, CDB, FAO, UNESCO e OIT). A CDB (conferência da diversidade biológica) ocorre motivada pelo paradigma da biodiversidade, no final do século XX, atuando como divisor de águas na questão, por levar em conta novos atores que, devido à valorização econômica da biodiversidade, desejam participar da discussão, como ONG’s, estados nações, empresas, entidades internacionais e populações locais.
A convenção tem como novidade compreender a relação dos modos de vida dos grupos com a manutenção da biodiversidade, postura que permite visualizar uma relação sociedade-natureza diferente da ecologia profunda, que coloca a necessidade de que a natureza seja isolada do convívio humana para que se mantenha, e coloca o em questão os direitos dos grupos sobre seus saberes, debate que só é possível com a inclusão desses grupos, que sempre estiveram à margem. Por alhures é ambígua, já que atua em consonância com a expansão da propriedade intelectual, se tornando um local não muito acessível para o debate sobre a defesa dos conhecimentos tradicionais.
Recursos genéticos da biodiversidade, segundo a CDB, estão sobre controle da legislação nacional, devendo o acesso se dar por acordo entre países. Com isso vários países regulamentaram os usos da biodiversidade e conhecimentos tradicionais. No Brasil, lei nº 2186 e 20017, e estaduais no Amapá e Acre. Essa necessidade de concedimento prévio é o que a convenção tem de reformadora.
No Brasil o principal suporte de direitos às comunidades tradicionais tem sido a Constituição, de forma mais imediata, a MP nº 2186-16/01.Consentimento dos povos tradicionais com repartição eqüitativa por meio de contrato, regulado por órgão governamental (Conselho Gestor do Patrimônio Genético, Ministério do Meio Ambiente), assim deve ser tratados os direitos tradicionais.
O acordo Trips faz da OMC um espaço de discussão sobre conhecimentos tradicionais, por seu envolvimento com a propriedade intelectual. Com a impossibilidade do estabelecimento de regras de concessão, pelo Trips, há a inviabilização do CDB. A OMPI tem um comitê, mas que até o momento não foi cenário de decisões.
Os problemas de enquadrar os direitos tradicionais nos patentários são vários, como o quesito de novidade, o da exclusividade. Isso abre a possibilidade de discutirmos direitos de propriedade sui generis. No caso brasileiro, temos a possibilidade de pensar esses direitos como patrimoniais e não como proprietários, concepção jurídica presente no regime constitucional brasileiro.Na Índia, os direitos intelectuais coletivos.
A complexidade dos direitos difusos em relação ao direito moderno, que se pautou no individualismo liberal, abre novos desafios. Eles são aplicados no Brasil primeiramente com a lei nº 7347/85, depois na CF e no Código de defesa do consumidor. Os conhecimentos tradicionais podem não se enquadrar em direitos difusos, mas são direitos coletivos. Sua pretensão, de acordo com os povos, é que determinará em que tipo de direito se enquadra. Há que diferenciar os direitos difusos, de alguém indeterminável, do domínio público, que não é de propriedade de alguém.
A leitura do texto, concatenada com reflexões e conhecimento de situações anteriores me levam a questionar se o Ministério do meio ambiente é a melhor esfera pública para tratar dos direitos das comunidades tradicionais, até por ter em seu quadro pessoas que podem ter uma compreensão ecológica mais restritiva frente aos povos tradicionais.
A autora coloca conhecimento tradicional e científico como com igual condição hierárquica, na página 15. Apesar de ver esse panorama como o mais interessante, não vejo que ocorra dessa forma. Na maior parte do tempo o conhecimento científico utiliza-se do poder estatal e outros como forma de submeter os conhecimentos tradicionais.
Acredito que dizer que os conhecimentos tradicionais têm valor “estritamente cultural, sem qualquer vínculo com o mercado” é equivocado, pois pode levar a conclusão que esses povos são anti-mercado ou que atuam fora dele. Se pensarmos que mercado se refere ao mercado pós-processo de mundialização, talvez isso esteja correto, mas a meu ver há aí um mercado, diferenciado, mas há. Talvez a melhor forma é não pensarmos cultura como separada de mercado.